Sabrina, Júlia e Bianca: um pouco mais sobre os famosos romances de banca

21 agosto 2021

Tive uma colega de trabalho – não vou revelar o seu nome, pois não sei se ela gostaria – que adorava ler romances de banca, principalmente “Sabrina” e “Júlia”. Tanto é verdade que após o fim dessas publicações, ela continuou a sua peregrinação pela internet, na esperança de encontrar alguns sites que disponibilizassem o download dos enredos.

Na época em que escrevi um post sobre o assunto, isso em 2011, ainda nos primórdios do blog, ela me disse que eu poderia ter se aprofundado mais nas origens dessas duas publicações. Pois é, o tempo passou, foram surgindo outros temas e a sugestão – muito boa por sinal - dessa minha ex-colega de trabalho ficou para trás. Acredito que se tivesse escrito um post complementando aquele de 2011, o retorno teria sido garantido. Isto porque, a postagem que fiz há 10 anos (essa aqui) continua sendo a mais acessada pelos leitores do blog com 201.429 acessos.

Mas tudo bem, antes tarde do que nunca. Esta minha colega tinha curiosidade em saber o que teria levado a editora Nova Cultural a escolher os nomes Sabrina, Julia e Bianca para as suas publicações. Ainda me lembro que certo dia ela deixou no ar o seguinte questionamento: - Será que algum editor importante ou então o dono da editora tinha alguma filha, mãe, tia ou avó que se chamava Sabrina ou Bianca e resolveu “batizar” a série com esses nomes? – Ela foi mais além e soltou outra pérola: - Será que eles se inspiraram no dono da fábrica de palitos Gina?! – Dei muita risada com essas colações, pois a Maria – nome fictício da minha colega – era muito alto astral.

Portanto, optei por iniciar esse post explicando a origem dos nomes dos dois mais famosos romances de bancas publicados no Brasil. Tudo começou no período de 1935 a 1960 quando a Companhia Editora Nacional, de São Paulo, publicou três coleções de livros chamadas: Coleção Azul, Coleção Rosa e Coleção Verde.

Os enredos dos romances eram dirigidos ao público feminino e ficaram conhecidos, na época, como livros para moças. Dentre as três coleções, a mais popular foi a Coleção Verde, também conhecida como Biblioteca das Moças, que contou com 175 títulos.

Os romances geralmente eram ambientados na França e possuíam enredos com estrutura bem definida: o herói nobre e rico e a heroína plebeia e pobre, perfazendo uma trama complexa que finalizava com o casamento feliz, tal qual nos contos de fada. O casamento era apresentado como a redenção da mulher, e todos os romances terminavam com o encontro do herói com a "mocinha".

A partir da década de 70 – para ser mais exato, a partir de 1977 – a Nova Cultural passou a publicar esses romances, mas ao herdar as publicações da Companhia Editora Nacional, a nova editora também herdou um grande problema de origem cultural. Eu explico melhor: as mulheres na década de 70 já haviam assumido um papel mais significativo na sociedade, muitas delas opinando sobre diversos assuntos. Dessa maneira, os editores da Nova Cultural acharam que o nome “Biblioteca para Moças” não cairia bem para uma série de publicações direcionadas ao público feminino digamos que... um pouco mais crítico. Sendo assim, a editora escolheu classificá-las de acordo com a peculiaridade de cada narrativa, optando por utilizar nomes femininos comuns da época (Sabrina, Julia e Bianca) para dar vida e nome a suas classes literárias. Capiche?

Ok, terminando esse bolo: Os nomes foram escolhidos aleatoriamente e não herdados de familiares ou donos da Nova Cultural. Quem sabe, eles não procuraram a relação dos nomes femininos nos anuários de recém-nascidos da década de 70 e depois fizeram algumas comparações para descobrir quais foram os nomes mais escolhidos pelos pais. Juro que pensei nessa hipótese enquanto escrevia essa postagem.

Definidos os nomes das publicações, o próximo passo da editora foi dividir esses nomes, ou seja, esses títulos em castas com cada um deles atingindo um grupo de leitoras específico. Dessa maneira, as protagonistas da série Sabrina eram mais atuais e o cenário mais moderno. As histórias mostravam conflitos do dia-a-dia gerados por mal-entendidos e ciúme, sempre coroados com um final feliz. Prova disso é que Jaine Florido, editora-executiva da Nova Cultural, disse numa entrevista em 1998 que os mil números de “Sabrina” tiveram final feliz. É mole?! Uma curiosidade é que nas primeiras "Sabrinas", não havia romances entre descasados e solteiras. Os homens eram, no máximo, viúvos. Ah! Quanto ao sexo, algo bem light e trivial, nada que assustasse (rs).

A série Bianca seguia as mesmas características apostando em histórias que seguiam a temática onde as protagonistas eram românticas e sonhadoras; a única diferença estava relacionada ao cenário, quase sempre antigo. Os relacionamentos amorosos dos personagens eram descritos de maneira bem sutil e poética.

Já os romances do segmento Júlia mandavam ver. Os enredos eram picantes na maioria das vezes explorando romances proibidos. As personagens eram mulheres maduras, decididas e sexy.

É importante frisar que mesmo sendo um pouco mais liberais do que Sabrina e Bianca, os enredos de Julia e Mirella não fugiam do estilo recatado da série de livros de banca.

Os trechos envolvendo cenas de sexo eram descritos e jamais chamavam os órgãos genitais pelo nome biológico, se referindo ao órgão feminino

como a ― “feminilidade” ou ao “triângulo cheio de pelos”; ao órgão masculino, as autoras davam o nome “membro enrijecido” e “ereção”. Penis, vagina, clitóris, orgasmo e cia nem pensar. A cada romance lido, era possível encontrar outros adjetivos usados para identificar os órgãos genitais como por exemplo: “afastando-lhe as pernas esguias e bem torneadas, James acomodou-se entre elas, encaixando o sexo vibrante na flor latejante e úmida”.

As tramas eram muito variadas, como a empregada que apaixonava pelo patrão, a mulher pobre que amava secretamente o patrão, a viúva que desejava o amor de seu humilde empregado, etc.

Quanto as capas, geralmente eram sensuais e mostravam casais apaixonados em clima romântico.

“Sabrina” foi a grande pioneira. Foi esta série, a primeira a ser lançada em 1977, mais de uma década e meia após o encerramento das atividades da Companhia Editora Nacional com as suas coleções azul, rosa e verde.

“Sabrina” revitalizaria o romance de banca em nosso País, que já era considerado um gênero praticamente morto e enterrado. Os primeiros livros fizeram tanto sucesso que no ano seguinte, 1978, a Nova Cultural colocaria no mercado a série “Julia”; e em 1979, a série “Bianca”. Assim, os donos da Nova Cultural estavam praticamente copiando uma fórmula que havia dado certo em 1935 com a Editora Nacional, ou seja, lançar uma série de livros com três selos diferentes. Com isso, “Sabrina” substituiria o selo verde; “Julia”, o rosa e “Bianca”, o azul.

As autoras das tramas era o menos importava no esquema. Quer uma prova? Então lá vai. Será que você que foi leitora assídua das “Sabrinas”, “Julias’ e “Biancas” se recorda de nomes como Anne Hampson, Sara Craven, Margery Hilton, Violet Winspear e outras? Se você disser que conhece uma dessas escritoras; com certeza estará mentindo.

Quando uma escritora era convidada a escrever um enredo para qualquer um dos três selos da Nova Cultural, ela tinha de seguir uma estrutura narrativa única e que pouco ou quase nada mudava. Uma verdadeira cartilha. Ah! Eram contratadas apenas escritoras desconhecidas da grande massa de leitor. Muitas delas sem nenhuma bibliografia na Net.

A Nova Cultural continuou distribuindo “Sabrina”, “Julia” e “Bianca” nas bancas até 2011. Depois disso passou a vender os livros da série apenas no site da editora.

E para finalizar, gostaria de acrescentar que muitas pessoas eram fãs tão ardorosas da série de romances de banca da Nova Cultural que na época chegaram a batizar os seus filhos com os nomes Sabrina, Bianca ou Júlia.


4 comentários

  1. Um detalhe nessa tua postagem me deixou curioso:
    "Acredito que se tivesse escrito um post complementando aquele de 2011, o retorno teria sido garantido. Isto porque, a postagem que fiz há 10 anos (essa aqui) continua sendo a mais acessada pelos leitores do blog com 201.429 acessos."
    Se essa é a postagem mais acessada, quais são as outras?
    Que tal fazer um top 10 das postagens mais acessadas do blog?
    Abraço!

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    1. Olá meu amigo!
      Ótima ideia! Aliás, você me deu duas ideias: um top list de postagens com as mais acessadas desde o início do blog e um post sobre as saudosas bancas que vendiam livros.
      Grande abraço!

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  2. Ótima postagem! Quando adolescente li muitos romances da famosa trinca, Sabrina, Júlia e Bianca. Me fizeram sonhar muito e alimentaram o meu desejo de um dia criar minhas próprias histórias. Até hoje vejo pessoas tratando essas obras como subliteratura e isso me entristece bastante, pois isso não é verdade... embora hajam histórias ruins, outras são belíssimas. Algo que não gosto (e que a Mills & Boon ainda exige) é a "cartilha" que as autoras precisam seguir. Acredito que isso limita muito a criatividade. No mais, ainda é uma boa pedida para relaxar e distrair a mente dos dias ruins. :)

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    1. Obrigado Mayara! Que bom que gostou!
      Sabe, não acredito muito em subliteratura. Acho que existem histórias boas e ruins; histórias com o poder de lhe proporcionar viagens especiais e ressacas literárias saborosíssimas e histórias que decepcionam. Com certeza, os romances de bancas presentearam muitas leitoras e porque não, muitos leitores, com viagens marcantes.
      Abraços!

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