“Dos dez, somente cinco”. Se tivesse de resumir, em
poucas palavras, o livro “Às Portas da Fantasia – Dez histórias escolhidas de
ficção científica”, a definição chegaria dessa maneira. Sem tirar, nem pôr. A
seleção de contos escritos por Robert Bloch e Ray Bradbury e organizados por
Kurt Singer dá para o gasto. Só isto. Até mesmo entre as cinco historietas -
que na minha opinião, passaram no teste - existem três que apesar de boas não merecem
estar na galeria das melhores antologias de terror dos dois autores. Portanto,
para não ficar enrolando muito, “Às Portas da Fantasia” oferece apenas duas
histórias fantásticas: “Os Títeres se Vingam” e “A Vez do Lobo”.
Acho muito pouco para uma obra que reúne novelas de dois
grandes mestres da ficção científica e da literatura fantástica. Bloch além de
roteirista, e dos bons, também criou em 1959 a sua obra máxima, Psicose,
considerada uma referencia no gênero terror/suspense. Quando a Bradbury, dispensa
comentários, ou será que vocês não leram ainda “Fahrenheit 451” e “Um Som de
Trovão”? – o primeiro, livro; o segundo, conto.
E foi com essa expectativa que não pensei duas vezes
para comprar “Às Portas da Fantasia – Dez histórias escolhidas de ficção
científica”. Pensei comigo: “Caramba! Não posso perder 10 contos dessas duas
feras da literatura fantástica!”. Ao terminar o livro, a sensação foi de
decepção, pois não queria ter encontrado apenas cinco histórias boas, mas dez! Na pior das hipóteses, até oito serviriam; mas
somente cinco?! E entre elas, apenas duas excelentes?!! Putz...
O livro da editora Expressão e Cultura foi lançado
em 1970 e apesar de ter o subtítulo “Dez histórias escolhidas de ficção
científica”, todos os seus 10 contos não tem elementos desse gênero literário.
Singer optou por selecionar histórias de terror e suspense, mas isso em nada
desmerece os cinco contos que considerei bons. Sei lá, acho apenas, que o subtítulo
não tem nada a ver com o conteúdo da obra.
Tá vendo só? Falei, falei; escrevi, escrevi e acabei
não revelando quais foram os outros três contos do livro que me agradou, além
de “Os Títeres se Vingam” e “A Vez do Lobo”. Ehehehe, já ia dando bom dia a
cavalo. Ok, então anotem: “O Campanário das Trevas”, “O Vampiro Zombeteiro” e
“O Manipulador”. Confiram um breve
resumo das histórias:
01
– O Campanário das Trevas (Robert Bloch)
O curioso nesse conto de Bloch, escrito em 1950, é
que ele transforma o escritor H.P. Lovecraft - com quem trocou cartas e de quem
recebeu incentivos em relação a seus primeiros contos – em um dos personagens
centrais. Um jovem escritor chamado Robert Blake visita um templo em ruínas
onde no passado um grupo de fanáticos fazia sacrifícios sangrentos considerados
terríveis. Orientado por Lovecraft, Blake faz descobertas assustadoras. O conto
atinge a sua tensão máxima nas páginas finais. Fiquei animado com a história,
acreditando que as próximas novelas do livro também seriam boas. E assim, na
sequencia chegou “Os Microespiões”, entonce... a casa começou a cair.
02
– Os Microespiões (Ray Bradbury)
A história de William Tinsley, um rico empresário,
que investiu um milhão de dólares em inseticidas, papel para pegar moscas e
toda sorte de preparados para acabar com as baratas, por achar que esses
insetos estavam preparando uma espécie de armadilha para ele, até empolga no
começo, mas a partir do meio do conto, quando os micróbios entram em ação e
fica explicado quais são as verdadeiras intenções desses micróbios no enredo, a
história degringola. Uma pena.
03
– O Vampiro Zombeteiro (Robert Bloch)
Cara, que conto! Amei e... me assustei! Não
imaginava aquele final. O conto é narrado por um médico psiquiatra que se
encontra internado num asilo de loucos, já que ninguém acredita na horripilante
história que ele garante ter vivido. Tudo começa quando o psiquiatra recebe em
seu consultório um homem estranho que diz ter alucinações tão medonhas que já
estão influenciando em sua sanidade mental. Todas as noites, o paciente sonha
estar caminhando entre os tumulo de um cemitério, até descobrir a passagem
secreta de uma catacumba onde entra e vê coisas de arrepiar.O médico tenta
esclarecer que tudo não passa de alucinações, até que...
04
– Os Títeres se Vingam (Robert Bloch)
Fantastic! Man, que conto de terror! Um famoso
neurocirurgião é encarcerado num asilo por ser considerado louco. No passado,
ele atendia soldados em campos de batalha e após um bombardeio, do qual só ele
conseguiu escapar com vida, acabou
ficando perturbado mentalmente e assim, foi trancafiado num asilo de
loucos sob os cuidados de um sádico psiquiatra. O neurocirurgião descobre que
pode criar bonecos de barro que adquirem vida, prontos para fazer tudo o que
ele ordenar. Esta história serviu de base para o episódio final de “O Asilo do
Terror”, filme britânico do gênero feito pela Amicus Productions em 1972 e
considerado um verdadeiro clássico.
05
– Um Delírio Metaléptico (Ray Bradbury)
Um menino fica doente e com muita febre. Resultado:
cama. O garoto percebe que começa a perder o controle dos braços, depois das
pernas e finalmente de todo o corpo. O problema é que tanto os seus pais quanto
o seu médico não acreditam nele. Então algo inesperado acontece. Não gostei.
06
– A Maldição do Druídas (Robert Bloch)
Conto que peca pelo mesmo defeito de “Os Microespiões”,
ou seja, começa bem, com expectativas, mas depois... O mote de “A Maldição dos
Druidas” – um fazendeiro cético descobre um altar pagão localizado no meio de
suas terras, recentemente adquiridas, e assim, resolve destruí-lo, sem dar
ouvidos aos clamores dos moradores nativos - é fantástico, mas a conclusão é
simplória e triste. Fiquei com a
impressão de que o autor abriu um buraco (literalmente falando) e como não
conseguiu encontrar um ‘the end’ mais adequado, jogo todo mundo dentro do
buraco.
07
– O Morto (Ray Bradbury)
O responsável pela seleção dos contos de “Às Portas da Fantasia” não foi feliz na
escolha das histórias de Bradbury – das quatro, apenas uma se salvou (“O
Manipulador”). “O Morto” é o pior conto
do livro: sem terror, sem sustos, sem medo e principalmente entediante ao
extremo. Bradbury fala de um cara que se
finge de morto numa pequena cidade e acaba se transformando em motivo de
chacotas dos moradores. Êta historinha chata!
08
– Uma Questão de Regulamento (Robert Bloch)
E vamos para o terceiro caso de mais uma história
com começo avassalador e repleta de expectativas, mas que, infelizmente, morre
no meio do caminho. Um recenseador demográfico que está colhendo dados dos
moradores de uma cidade, acaba batendo na porta da casa de uma bruxa. Ao
entrar, começa a escutar as histórias da mulher e acredita que ela sofra de
algum transtorno mental, mas após presenciar algumas atitudes incomuns, é
obrigado a acreditar no impossível. O final insosso arrebentou o conto.
09
– O Manipulador (Ray Bradbury)
O desenrolar cômico e sombrio da história contrasta
com o seu final trágico e sangrento. Bradbury foi muito feliz no final aberto
que decidiu reservar aos seus leitores. Benedict é um agente funerário, motivo
de chacotas dos moradores de sua cidade. Humilhado e desrespeitado pelos vivos,
Benedict resolve dar o troco nessas mesmas pessoas, mas somente após elas
morrerem! Um conto de humor negro muito legal.
10
– A Vez do Lobo (Robert Bloch)
Depois de “Os Títeres se Vingam”, este é o outro conto
fora de série da coletânea selecionada por Singer. Uma autentica e verdadeira
história de lobisomens, como deve ser: com sustos, amores impossíveis, muito
sangue e um enredo que foge do ‘basicão’ das histórias de licantropia. A mulher
de um escritor de novelas de terror tem convicção de que está sendo perseguida por um lobisomem, mas o
seu marido não acredita. No desenrolar da trama vão surgindo surpresas atrás de
surpresas, deixando o leitor também surpreso. Bloch foi feliz ao finalizar a
obra. Um ‘the end’ que vai jus as melhores histórias de lobisomens.
Taí galera. Se estiverem a fim de um livro com dez
contos, onde apenas cinco valem a pena serem lidos, comprem logo.
Inté!
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