Hoje, acordei com muitas saudades da minha época de
estudante primário e também do antigo ginasial. Não me perguntem o motivo
porque, simplesmente, não conseguiria responder. Sabem aqueles insights que
surgem de repente? Acho que foi isso. Talvez possa ter havido um gatilho, aliás,
acredito que sempre exista um gatilho para as nossas lembranças mais distantes,
aquelas que se encontram guardadas nos compartimentos mais profundos da nossa
memória. É como se esse gatilho fosse uma chave capaz de abrir esse
compartimento. E o meu gatilho, a minha chave, foi um bate papo durante o café
da manhã que estava tendo com Lulu sobre uma professora do primário, mãe de um
amigo nosso, que já havia falecido há algum tempo. Ela tinha lecionado numa
escola onde futuramente pretendo fazer uma reportagem para o meio de
comunicação onde trabalho. Dona Cecília e a tal escola tinham muito em comum
comigo: ela foi minha professora no primário nessa mesma escola que será o tema
da minha matéria. Pronto; bimba! Dois gatilhos, duas chaves numa pancada só.
Estas duas chaves abriram as portas de lembranças
deliciosas que estavam guardadas nessa caixa secreta escondida em minhas
memórias. Lembrei-me de alguns livros, entre eles o famoso Desenho Cop,
considerado o “bam-bam” daquela época, Caminho Suave, Atlas do Brasil e tantos
outros. Lembrei do meu saboroso misto-quente com pão, presunto e queijo e também
da limonada preparados com todo o carinho pela minha mãe e acondicionados na
minha lancheira que levava pendurada no ombro. Depois, mais para frente, no
Ginasial, lembrei-me do compasso, da velha carteira escolar de madeira, da
caixa de lápis coloridos, da tabuada e etc, mais etc.
Este insight gostosíssimo que tive foi o ponto de
partida para a criação desse post onde gostaria de recordar alguns desses
materiais, livros e cartilhas escolares.
Se você foi uma criança dos anos 70, certamente vai se
lembrar que leva o seu material para a escola em pastas ou então naquelas
malinhas de couro marrom. As mochilas de rodinhas ou até mesmo aquelas de alças
cruzadas que, hoje, os estudantes levam atreladas às suas costas, ainda eram um
sonho muito distante.
Quanto a lista do material escolar, basicamente era
composta de lápis, preferencialmente, da marca Fritz Johansen; borracha; caneta
tinteiro; régua de madeira; estojo de lata ou madeira; caderno tipo brochura,
daqueles que você não podia nem pensar em retirar uma folha senão o caderno se
desmontava inteiro; cadernos de caligrafia, de desenho e de linguagem; folhas
de papel ao maço pautadas; vidrinho com cola Goma Arábica e mata borrão.
O lápis era um item fundamental para escrever e
desenhar, e as borrachas eram geralmente de borracha branca e simples. Quanto
as canetas esferográficas, embora já existissem na década de 60, elas começaram
a se popularizar na década de 70 como uma alternativa mais durável às
canetas-tinteiro.
E por acaso, vocês se lembram das aulas de geometria?
Se vocês se lembram, naturalmente também irão se recordar de dois materiais que
eram considerados indispensáveis para essas aulas: o transferidor e o compasso.
Ah! Não podemos esquecer, também, de dois parentes próximos do transferidor e
do compasso: a régua e o esquadro, outros itens essenciais para desenho técnico
e medição.
Antes de “falarmos” sobre livros didáticos (tema mais
chegado a proposta desse blog) vamos recordar como era a estrutura organizacional
das escolas de décadas passadas, para ser mais exato, dos anos 60 e 70. O
primeiro detalhe que gostaria de ressaltar é que naquela época havia um
respeito mútuo entre professores, colegas e alunos. Esqueça os casos de agressões
verbais ou físicas de estudantes em professores, hoje tão comum nas escolas.
Não; naquela época, essa atitude seria algo impensável, até mesmo surreal.
Toda classe tinha um líder que geralmente ficava com a
chave da porta da sala de aula durante o recreio, além do bedel (fiscal) que ficava
no corredor para ajudar em alguma necessidade por parte dos alunos. Havia
disciplina e hierarquia.
As matérias escolares também eram muito diferentes das
disciplinas de hoje. Vamos ver se me recordo de algumas, vamos lá: no antigo
Científico – hoje, Ensino Médio – tínhamos OSPB (Organização Social Política
Brasileira), onde os alunos aprendiam tudo sobre política (não partidária),
cultura e curiosidades sobre as regiões brasileiras. Tínhamos ainda nessa época
aulas de Educação, Moral e Cívica, quase que semelhantes a OSPB; Desenho;
Matemática que era chamada pelos alunos de Aritmética; Religião; Linguagem e
mais uma que certamente a galera não conseguirá se lembrar. Ok, lá vai: Canto
Orfeônico, E aí? Se lembrou (rs). Pois é, acredite; pode ser que você tenha
estudado essa disciplina e nem se lembre.
De acordo com o site Mônica Alma de Viajante (www.monicaalmadeviajante.com)
que encontrei durante as minhas zapeadas; no final dos anos 1960, os
professores de escola pública tinham salários equiparados aos dos professores
universitários. Os professores do ginásio (hoje ensino fundamental) trabalhavam
também em outras instituições como Banco do Nordeste, Tribunal de Justiça (um
desembargador que era o presidente do Tribunal), UECE (Universidade Estadual do
Ceará), Colégio Militar etc.
No início dos anos 1970, ainda havia banca examinadora
para a cátedra do “professor Tal” ou para a cadeira de latim, língua
portuguesa, dentre outras. Em relação ao aluno, podia ser aprovado ou
reprovado. Existia a “segunda época” (prova escrita), realizada quinze dias
antes de começar o ano letivo do ano seguinte, de modo a dar chance ao discente
de ainda passar de ano. Se não se dedicasse aos estudos, não passaria.
Mas vamos nos ater agora, aos livros didáticos
utilizados pelos estudantes naqueles saudosos tempos. Aliás, já escrevi um
post, anteriormente, sobre esse tema (ver aqui e mais aqui) mas mesmo assim, vou rememorar
mais alguns livros e cartilhas que deixaram saudades.
Um desses livros didáticos considerados obrigatórios
nos anos 60 e 70 se chamava Admissão no
Ginásio. A obra teve sua primeira edição publicada em 1943, pela Editora do
Brasil e em 1970 já havia ultrapassado mais de 550 edições. Sua publicação e
circulação se deram no contexto dos exames de admissão ao ginásio. Nos anos 60
e 70 para que um aluno chegasse a frequentar um Ginásio do Ensino Público (os 4
anos após o primário, hoje as 5a, 6a, 7a
e 8as séries) era necessário que passasse pelo Exame de Admissão ao Ginásio,
um vestibular seletivo, devido ao número insuficiente de escolas. Por isso o
livro Admissão ao Ginásio era muito
famoso naqueles idos tempos.
Mas, cá entre nós, se há um livro didático ou cartilha
escolar que pode receber o título de antológica, essa obra se chama Caminho Suave. Esta publicação fez a
cabeça de uma geração de professores e alunos dos anos 60 e comecinho da década
de 70.
Aprovado pela Comissão do Livro Didático do
Departamento de Educação do Estado de São Paulo. A cartilha de Leitura era
usada, geralmente, a partir do segundo ano primário. Aprovado pela Comissão
Nacional do Livro didático. Caminho Suave foi um fenômeno de vendas no Brasil:
calcula-se que todas edições, até a década de 1990, venderam 40 milhões de
exemplares.
Outra cartilha que imperou no final dos anos 60 e
início da década de 70 foi o Desenhocop
que era utilizado nas saudosas aulas de Desenho. O Desenhocop tinha um conjunto de folhas finas de papel vegetal com
desenhos que abrangiam grande variedade de temas escolares e também do nosso
dia a dia. Bastava o aluno passar o lápis no contorno do desenho para que ele
fosse reproduzido no caderno ou no papel almaço. Depois, a cópia do desenho
estava pronta para encarar a fase de pintura.
Os livros de História e de Português também deixaram
uma baita saudade em todos os estudantes que viveram aquela geração. Os livros
de História do Brasil geralmente traziam a imagem de Pedro Alvarez Cabral ou
então de alguns índios na época do descobrimento ou Bandeirantes como destaque
na capa; já nos de Português era comum vermos imagens de Camões.
Não podemos esquecer, também, do famoso Atlas
Geográfico. Aproveitando esse assunto, por qual motivo esse livro didático se
chamava Atlas? ‘Entonce”, acredita-se que o nome Atlas tenha origem na lenda
grega em que a figura mitológica Atlas foi castigada pelos deuses, que o
obrigaram a segurar a Terra e os céus em seus ombros. O Atlas geográfico não
chega a “segurar” céus e a Terra, mas, muitas vezes, contém a representação da
Terra em diversos formatos e temas. Interessante essa explicação, não acham?
E agora que estou chegando perto do fim dessa
postagem, seria uma grande injustiça se me esquecesse de duas “cositas” que
marcaram a vida de nós, estudantes do ginasial dos anos 60 e 70. A primeira
delas foi a saudosa máquina de mimeógrafo ou será que você nunca sentiu aquele
cheirinho de álcool ao receber a prova do bimestre? O mimeógrafo era uma
espécie de “impressora manual” que funciona à base de tinta e álcool.
A outra ‘cosita’ era o “Google” dos estudantes daquela
geração - a qual tive a alegria de fazer parte. O nosso “Google” se chamava
“Barsa”. Pesquisar antigamente não era uma tarefa fácil. Qualquer trabalho
escolar exigia uma visita a uma biblioteca, horas e horas de pesquisa e depois,
tudo escrito a mão, geralmente numa folha de papel almaço. Para facilitar a
vida dos estudantes, existiam as enciclopédias: coleções de livros enormes,
geralmente abrangendo uma grande gama de conhecimentos gerais.
Lançada em 1964, a Barsa foi a primeira enciclopédia
feita especialmente para o Brasil. Seus dezesseis volumes se tornaram uma
referência em conhecimentos gerais para todos nós, alunos, que vivemos aquele
saudoso período.
Encerro esse post recordando do barulho do sinal. Parece
que estou ouvindo ‘ele’ tocar. Como era gostoso aquele barulhinho do sinal do
recreio. Quando tocava, saíamos correndo das salas, direto para o pátio comer
um lanche, comprado na cantina ou preparado pelas nossas mães e que vinha
guardadinho em nossa lancheira embrulhado em papel alumínio, acompanhado de uma
garrafa de limonada ou QSuco. E no final, quando chegava a hora de ir pra casa,
novamente o bedel batia o sinal e então, saíamos correndo para os braços de
nossas mães que estavam esperando por nós na porta da escola. Ainda me lembro
que o sinal da minha escola era um sino de mão. Antes de o bedel - que se
chamava Servilho - chacoalhar o “bichão” já sabíamos que viria aquele
“bleim-bleim-bleim-bleim”... era o sinal aguardado por todos nós.
Putz! Que saudades daquela época.
Postar um comentário