Circe: Feiticeira, Bruxa, entre o castigo dos deuses e o amor dos homens

08 outubro 2023

Para aqueles que leram a postagem anterior e estão curiosos com relação a saga da minha Consul. Eu respondo: “Sim; ela continua escancaradamente escancarada e... quebrada. Parece que os “doutores” estão divergindo, e muito, sobre a sua “doença”. Sério: estou fortemente propenso a comprar uma nova geladeira. Não sei, se Consul, novamente (rs). Mas vamos ao que interessa, chega de divagações.

Galera, li recentemente Circe: Feiticeira, Bruxa, entre o castigo dos deuses e o amor dos homens e amei! Madeline Miller que livro você escreveu! Uma justa homenagem para uma das personagens mais icônicas da mitologia grega, mas que foi injustamente explorada neste gênero literário. Que eu saiba, ela aparece em A Odisseia de Homero e em poucas linhas, num trecho muito curto. Neste clássico da literatura mundial, ela é retratada apenas como uma deusa feiticeira que transforma homens em porcos e acaba se apaixonando por Ulisses e por isso decide utilizar alguns de seus artifícios para prendê-lo na ilha de Eana. A Odisseia como sabemos, tem todos os seus holofotes direcionados para o herói grego Ulisses e suas aventuras visando o seu retorno a Ítaca, a pós a Guerra de Tróia.

Quando li a obra de Homero, Circe me fisgou logo de cara, mesmo aparecendo muito pouco na trama. Sua inteligência, personalidade e sagacidade me conquistaram tanto que acabei ficando frustrado por ela ter sido apenas uma mera coadjuvante nos versos ou prosa de A Odisseia. Por isso, há algum tempo, quando Madeline Miller anunciou que escreveria um livro contando a história de Circe desde o seu nascimento até a fase adulta, comemorei muito.

E esta comemoração foi ainda maior quando soube que a autora construiu a história após ter lido muitas pesquisas, incluindo a própria A Odisseia em grego antigo, além de muitos estudos sobre o texto de Homero. Fiquei sabendo, após algumas pesquisas, que foram dez anos dedicados ao aprofundamento no mundo da mitologia grega. Vale lembrar que Miller é professora de latim e grego e atuou no departamento de dramaturgia da Yale School of Drama, onde fazia adaptações dos textos clássicos para a linguagem atual.

Madeline Miller

Cara, com todas essas referências o meu termômetro de expectativa com relação ao lançamento da obra ultrapassou os 40 graus. Assim, não pestanejei nenhum segundo para comprar Circe: Feiticeira, Bruxa, entre o castigo dos deuses e o amor dos homens.

Como já ‘disse’, a autora escreveu um livraço onde temos a oportunidade de conhecer em detalhes essa personagem marcante da mitologia grega. E o melhor: tudo narrado em primeira pessoa, ou seja, por ela, Circe. Fiquei sabendo que a famosa feiticeira da mitologia é filha de Hélio, o Sol, e por ser considerada uma divindade menor, além de filha menos interessante em comparação com os seus outros dois irmãos - Eeetes, rei da Cólquida, guardião do velo de ouro, e de Pasífae, mulher de Minos – acaba sendo renegada. Ainda jovem, ao conversar com Prometeu – às vésperas de sua punição por ceder o fogo à humanidade –, Circe sente-se inexplicavelmente atraída pelos mortais.

É a partir dessa rejeição pelos deuses que tem início o crescimento de Circe e o seu interesse pelos seres humanos. O seu empoderamento começar a dar os primeiros passos depois da atitude tomada pelos seus pais e apoiada pela poderosos deuses do Olimpo. Aos poucos, ela vai descobrindo seus feitiços, um novo tipo de poder temido por titãs e olimpianos, e é banida para uma ilha deserta chamada Eana. Nesta nova fase de sua vida, a personagem vai crescendo, crescendo até se tornar uma deusa temida pelos poderosos olimpianos, capaz de enfrentar até mesmo Atena, filha de Zeus, considerada uma das deusas mais poderosas do Olimpo.

Representação de Circe transformando homens em porcos

Mais do que ser uma obra sobre o empoderamento feminino, Circe: Feiticeira, Bruxa, entre o castigo dos deuses e o amor dos homens esmiuça várias passagens e histórias marcantes da mitologia grega, as quais os leitores tem apenas um conhecimento básico ou superficial. Por exemplo, o mito de Cilla, monstro marinho que em A Odisseia devorou seis dos companheiros de Ulisses. Na mitologia, Cila é uma criatura sobrenatural, com 12 pés e 6 cabeças de longos pescoços, cada cabeça tinha uma fileira de afiados dentes triplos, enquanto que os seus lombos foram cingidos com as cabeças de cães latindo. Ela faz sons horríveis e devora qualquer marinheiro que se aproximar o suficiente para que ela coloque seus pescoços para fora e agarrá-los.

A autora conta toda a origem de Cilla que antes de se tornar esse terrível monstro era um ser humano normal que se relacionava com Circe, mas algo nesse relacionamento acabou mudando para sempre o destino de Cilla.

Miller seleciona ainda alguns outros mitos e costura-os em uma narrativa coesa de modo a construir uma personalidade consistente para Circe, justificando alguns de seus atos mais cruéis, como seu péssimo hábito de transformar marinheiros em porcos, bem descrito no 10º canto da Odisseia. E confesso que após ter conhecimento dos motivos que levavam Circe a ter essa atitude, não tirei um grama de sua razão; se quer saber... até vibrei.

O encontro de Circe e Ulisses na ilha de Eana também é desmistificado pela autora que narra essa icônica passagem de A Odisseia sob a visão da feiticeira. Neste trecho da obra passamos a conhecer um outro lado da personalidade de Ulisses e que talvez possa chocar alguns leitores que o veem apenas como um dos grandes heróis guerreiros de Ilíada e A Odisseia.

Temos também a oportunidade de presenciar novas passagens que nunca foram retratadas em outras histórias da mitologia como o encontro de Circe com o Minotauro ou como ela conheceu Dédalo, outro importante personagem da mitologia grega.

O livro confere profundidade a Circe, desmistificando sua tirania – tão arraigada na cultura ocidental.  Que livro! Que personagem! Valeu muito a leitura.

 

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