No Coração do Mar

19 fevereiro 2016
“No Coração do Mar” do historiador Nathaniel Philbrick é um livro estritamente jornalístico, à exemplo de “A Tormenta: Ahistória real de uma luta de homens contra o mar”, de Sebastian Junger. Por isso, se você estiver a fim de ler uma versão romanceada do famoso naufrágio do navio baleeiro Essex, no século XIX, absolutamente esqueça. Se bem que eu ache muito difícil qualquer leitor – mesmo aqueles que não apreciem o gênero – abandonar o livro no início da leitura. O enredo é uma teia de aranha e te prende logo no prefácio. Depois... você não consegue mais escapar.
Logo de cara, o autor já adianta o final da história, ao contar como foi o resgate de dois sobreviventes do naufrágio que permaneceram três meses perdidos no meio do Oceano Pacífico. Pelo relato, já nas primeiras páginas, o leitor tem uma noção do que irá encontrar no decorrer da obra. A leitura, meu amigo, é do tipo ‘trucão’ com direito a canibalismo, jogo da sorte pra decidir quem morre para ser devorado, beber a própria urina para matar a sede, comer ‘craca’ das madeiras de barco ou então cozinhar entranhas de tartarugas em seu próprio casco para amenizar a fome descontrolada e animal.
Os oito, dos 21 tripulantes do Essex, que sobreviveram passaram por uma verdadeira via crucis.
A estrutura narrativa de “No Coração do Mar” é, basicamente, dividida em seis momentos: a história da ilha de Nantucket, localizada na costa leste dos Estados Unidos, considerada no século XIX como a capital baleeira do mundo. A apresentação dos 21 tripulantes do Essex. O ataque do cachalote de 26 metros que afundou o baleeiro. A luta pela sobrevivência em alto mar da tripulação que se dividiu em três botes. O resgate dos oito sobreviventes (cinco nos botes e outros três que optaram por ficar numa ilha deserta, perdida no meio do Pacífico). E, finalmente, o destino dos sobreviventes após alguns anos da tragédia.
Em vários momentos, a leitura se torna angustiante. Cara, imagine você perdido no meio do Oceano Pacífico, dividindo o espaço de um bote minúsculo com outras pessoas? Quer mais? Ok, lá vai: enfrentando, ainda, um sol escaldante ou então vendáveis com raios, trovões e ondas enormes capazes de virar a sua frágil embarcação a qualquer momento. Dureza heimm?!
Philbrick narra os limites de sobrevivência enfrentados pelos marujos do Essex em meio as águas geladas do Pacífico. O primeiro grande desafio  foi a fome. A pouca comida resgatada proporcionava apenas 500 calorias para cada um dos 21 tripulantes divididos nas três minúsculas baleeiras.
O próximo martírio foi a sede. “A violência da sede delirante não encontra paralelo no catálogo das calamidades públicas”, observou Owen Chase – o primeiro imediato do Essex - na época. Resultado: gargantas irritadas, saliva grossa e língua inchada. Pouco mais de 20 dias depois, a solução foi beber a própria urina.
Quando a fome atingiu níveis incontroláveis, a saída foi comer os cadáveres daqueles que morreram por inanição. Lembrando que antes da falta de alimentos, os mortos eram jogados no mar.
Não demorou muito para o desespero atingir níveis ainda maiores. Diante da absoluta falta de comida, decidiu-se fazer uma espécie de votação para definir quem seria o próximo a servir de alimento aos sobreviventes. Para saber quem seria o eleito, eles tiravam a sorte como num jogo de cartas ou palitos. Enfim, uma verdadeira roleta russa macabra.
Philbrick mescla em sua narrativa, depoimentos dos cinco sobreviventes - principalmente do capitão do Essex, George Pollard Jr.; do 1º Imediato, Owen Chase e do camareiro, Thomas Nickerson – com informações técnicas relacionadas a tragédia.
Mais do que uma aventura, a tragédia desses homens – alguns ainda adolescentes, na época – desafia o leitor a refletir sobre a capacidade de resistência do espírito humano diante de adversidades insuperáveis.

Enfim, uma leitura obrigatória para aqueles que quiserem conhecer detalhes sobre o naufrágio mais comentado do Século XIX.

3 comentários

  1. Ótimo artigo, estava curioso sobre o livro que serviu de base para o filme desse ano com o mesmo nome. Tenho uma sugestão para um artigo: outro dia encontrei num sebo a novelização do filme "Hook: A Volta do Capitão Gancho", escrita por Terry Brooks. Eu sei, pelas matérias mais antigas do blog, que você abomina esse tipo de livro. Mas caso já tenha alguma vez colocado as mão nessa obra, queria saber se vale a pena.

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    1. Olá Gerson,
      Sinto não poder lhe ajudar com a minha opinião pessoal, já que não li o livro. Fiquei sabendo da versão romanceada do filme através do seu comentário. Pelo o que eu pude descobrir, trata-se de uma versão integral do roteiro do filme. Por isso, recomendo a leitura, somente se vc ainda não assistiu a produção cinematográfica; caso contrário vc assistirá ao filme através das páginas.
      Deixo o link dos comentários de dois leitores cadastrados no Skoob e que leram a obra.
      Espero ter ajudado.
      OBS:Fico feliz que tenha gostado do post "No Coração do Mar".
      Grande abraço!

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  2. Diferente do filme, que é chatíssimo, esse livro é maravilhoso.

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