“No Coração do Mar” do historiador Nathaniel
Philbrick é um livro estritamente jornalístico, à exemplo de “A Tormenta: Ahistória real de uma luta de homens contra o mar”, de Sebastian Junger. Por
isso, se você estiver a fim de ler uma versão romanceada do famoso naufrágio do
navio baleeiro Essex, no século XIX, absolutamente esqueça. Se bem que eu ache
muito difícil qualquer leitor – mesmo aqueles que não apreciem o gênero –
abandonar o livro no início da leitura. O enredo é uma teia de aranha e te
prende logo no prefácio. Depois... você não consegue mais escapar.
Logo de cara, o autor já adianta o final da
história, ao contar como foi o resgate de dois sobreviventes do naufrágio que
permaneceram três meses perdidos no meio do Oceano Pacífico. Pelo relato, já nas
primeiras páginas, o leitor tem uma noção do que irá encontrar no decorrer da
obra. A leitura, meu amigo, é do tipo ‘trucão’ com direito a canibalismo, jogo da
sorte pra decidir quem morre para ser devorado, beber a própria urina para
matar a sede, comer ‘craca’ das madeiras de barco ou então cozinhar entranhas
de tartarugas em seu próprio casco para amenizar a fome descontrolada e animal.
Os oito, dos 21 tripulantes do Essex, que
sobreviveram passaram por uma verdadeira via crucis.
A estrutura narrativa de “No Coração do Mar” é,
basicamente, dividida em seis momentos: a história da ilha de Nantucket,
localizada na costa leste dos Estados Unidos, considerada no século XIX como a
capital baleeira do mundo. A apresentação dos 21 tripulantes do Essex. O ataque
do cachalote de 26 metros que afundou o baleeiro. A luta pela sobrevivência em
alto mar da tripulação que se dividiu em três botes. O resgate dos oito sobreviventes
(cinco nos botes e outros três que optaram por ficar numa ilha deserta, perdida
no meio do Pacífico). E, finalmente, o destino dos sobreviventes após alguns
anos da tragédia.
Em vários momentos, a leitura se torna angustiante.
Cara, imagine você perdido no meio do Oceano Pacífico, dividindo o espaço de um
bote minúsculo com outras pessoas? Quer mais? Ok, lá vai: enfrentando, ainda,
um sol escaldante ou então vendáveis com raios, trovões e ondas enormes capazes
de virar a sua frágil embarcação a qualquer momento. Dureza heimm?!
Philbrick narra os limites de sobrevivência
enfrentados pelos marujos do Essex em meio as águas geladas do Pacífico. O
primeiro grande desafio foi a fome. A
pouca comida resgatada proporcionava apenas 500 calorias para cada um dos 21
tripulantes divididos nas três minúsculas baleeiras.
O próximo martírio foi a sede. “A violência da sede
delirante não encontra paralelo no catálogo das calamidades públicas”, observou
Owen Chase – o primeiro imediato do Essex - na época. Resultado: gargantas
irritadas, saliva grossa e língua inchada. Pouco mais de 20 dias depois, a
solução foi beber a própria urina.
Quando a fome atingiu níveis incontroláveis, a saída
foi comer os cadáveres daqueles que morreram por inanição. Lembrando que antes
da falta de alimentos, os mortos eram jogados no mar.
Não demorou muito para o desespero atingir níveis
ainda maiores. Diante da absoluta falta de comida, decidiu-se fazer uma espécie
de votação para definir quem seria o próximo a servir de alimento aos
sobreviventes. Para saber quem seria o eleito, eles tiravam a sorte como num
jogo de cartas ou palitos. Enfim, uma verdadeira roleta russa macabra.
Philbrick mescla em sua narrativa, depoimentos dos
cinco sobreviventes - principalmente do capitão do Essex, George Pollard Jr.;
do 1º Imediato, Owen Chase e do camareiro, Thomas Nickerson – com informações
técnicas relacionadas a tragédia.
Mais do que uma aventura, a tragédia desses homens –
alguns ainda adolescentes, na época – desafia o leitor a refletir sobre a
capacidade de resistência do espírito humano diante de adversidades
insuperáveis.
Enfim, uma leitura obrigatória para aqueles que quiserem
conhecer detalhes sobre o naufrágio mais comentado do Século XIX.
3 comentários
Ótimo artigo, estava curioso sobre o livro que serviu de base para o filme desse ano com o mesmo nome. Tenho uma sugestão para um artigo: outro dia encontrei num sebo a novelização do filme "Hook: A Volta do Capitão Gancho", escrita por Terry Brooks. Eu sei, pelas matérias mais antigas do blog, que você abomina esse tipo de livro. Mas caso já tenha alguma vez colocado as mão nessa obra, queria saber se vale a pena.
ResponderExcluirOlá Gerson,
ExcluirSinto não poder lhe ajudar com a minha opinião pessoal, já que não li o livro. Fiquei sabendo da versão romanceada do filme através do seu comentário. Pelo o que eu pude descobrir, trata-se de uma versão integral do roteiro do filme. Por isso, recomendo a leitura, somente se vc ainda não assistiu a produção cinematográfica; caso contrário vc assistirá ao filme através das páginas.
Deixo o link dos comentários de dois leitores cadastrados no Skoob e que leram a obra.
Espero ter ajudado.
OBS:Fico feliz que tenha gostado do post "No Coração do Mar".
Grande abraço!
Diferente do filme, que é chatíssimo, esse livro é maravilhoso.
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