Memórias de uma gueixa

15 julho 2014
Eu me recordo que ao adquirir “Memórias de uma Gueixa” não estava com boas expectativas com relação ao livro de Arthur Golden. Havia assistido ao filme em 2005 e sinceramente não gostei. Achei a história xôxa e os atores mais xôxos ainda, mas ao passar por um shopping acabei comprando o livro influenciado pelo meu primo que me acompanhava numa viagem até Aparecida do Norte. “Li o livro e é muito bom! Pode comprar sem medo”, disse ele. Então, resolvi arriscar e não me arrependi. O enredo envolvente que falta no filme, sobra no livro.
O romance de Golden é narrado em primeira pessoa por Chiyo Sakamoto/Sayuri, a mais famosa gueixa do Japão. Tão famosa que a sua vida chega a ganhar contornos míticos;  mas engana-se quem pensa que Chiyo com a sua inteligência, perspicácia e beleza estonteante teve sempre do bom e do melhor. Nada disso. A sua infância foi ‘braba’: com a mãe doente e o pai idoso, sem condições de cuidar da família; a menina logo aos nove anos de idade caiu no mundo, sendo vendida ao Okyia Nitta, nome dado as casas onde viviam as gueixas no Japão.
No Okyia, ela passa a conhecer uma nova realidade bem diferente daquela com a qual estava acostumada. Chiyo passa a ser tratada como uma verdadeira escrava, além de ser constantemente humilhada por Hatsmomo, considerada a mais bela gueixa de sua época e que também mora, com todas as regalias, no Okyia. Aliás, Hatsumomo nutre um ódio mortal por Chiyo, por enxergar naquela simples criança uma rival, capaz de desbancá-la do trono de gueixa mais famosa do mundo. Por isso, a vida da menina se transforma num inferno e muitas vezes ela chega a pensar em desistir, mas como não tem nenhum lugar para ir ou ficar é obrigada a se sujeitar as humilhações – verdadeiras pisadas na cara – de Hatsumomo e de também uma “véia” danada de asquerosa e interesseira. A ‘véia treva’ é responsável (quer dizer uma das responsáveis) pelo Okyia.
Olha galera, vocês podem até me excomungar, me expurgar ou me matar, mas na minha opinião, em alguns trechos do livro, o enredo lembra muito a obra de Frances Hodgson Burnett: A Princesinha. – “Ahahahahaha!! Esse cara pirou!!”. É isso que vocês estão gritando? Então, vamos aos fatos, capisce? O mais “incriminador” deles é a luta de uma criança para sobreviver num mundo hostil com uma inimiga pronta para comê-la viva. Tudo bem que os ambientes são bem distintos - enquanto Sara Crewe, em “A Princesinha”,  passa poucas e boas num internato; Chiyo sofre numa casa para gueixas – mas as situações são semelhantes. As personagens comem o pão que o diabo amassou num lugar hostil, onde todos as odeiam, mas conseguem superar tudo isso com muita coragem e força de vontade. Tanto Chyio quanto Sara fazem amizade com uma boa alma, uma espécie de tutor  que se torna companheiro (a) inseparável nos momentos de sofrimento. Esse “anjo da guarda” acaba sendo a responsável pela reviravolta na vida das personagens sofredoras. Foi assim nos dois romances, por isso, guardadas as devidas proporções, Sara Crewe e Chiyo Sakamato tem muitas semelhanças entre si.
Uma personagem, realmente, incrível no romance de Golden é Mameha, a tutora de Chiyo e que lhe ensina todos os segredos para se tornar gueixa de verdade. Mameha, além de bonita e sedutora é puro mistério, completamente segura de si, inteligente e perspicaz; atributos que Chiyo passa a adquirir ao longo de seu aprendizado. Quando Chiyo se transforma  numa autêntica gueixa, troca o seu nome para Sayiuri e a partir daí tem início o seu reinado. É ela que narra todas as suas aventuras e desventuras no livro.
“Memórias de uma Gueixa”, antes de ser um romance, um Bestseller, é um verdadeiro mergulho na cultura japonesa, sobre os costumes daquele país, principalmente durante e após a 2ª Guerra Mundial, período em que se desenrola a história.
Ah! Antes que me esqueça: nós ocidentais, quase sempre confundimos gueixas com prostitutas de luxo. Nada a ver. Bem, leiam o livro e entendam as diferenças.
Nas minhas zapeadas pelas redes sociais, enquanto preparava o post, descobri que a personagem Chiyo/Sayiuri foi inspirada numa ex-gueixa real chamada Mineko Iwasaki. Ela acabou ficando revoltada com a história – tanto do livro quanto do filme – e decidiu mover um processo contra autor e diretor, por ter sua "privacidade desrespeitada". Iwasaki não gostou de ver divulgada a prática da "mizuage" que é a venda da virgindade de uma jovem gueixa a quem der o lance mais alto. O autor do livro, por sua vez, afirmou que foi fiel ao que a ex-gueixa lhe disse. Aproveitou ainda para disparar na época do lançamento do livro:  "O fato é que agora todos querem ganhar um pouco de dinheiro com a publicidade em torno do livro de do filme."

Bem, deixando as polêmicas, discussões, processos e ‘pega pra capá’ de lado, “Memórias de uma Gueixa” é fantástico. Um livraço para não ser lido, mas sim, devorado.

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