Posso fazer uma pergunta ‘na lata’ prá você? Promete que, também, vai me responder ‘na lata’, sem parar prá pensar? OK, lá vai. “Qual foi o trecho do livro O Exorcista que mais lhe perturbou?”
Pêra aí um pouquinho; vou refazer a pergunta: “Qual foi o
trecho mais perturbador do livro O Exorcista que após décadas ainda não saiu de
sua cabeça provocando horrendos calafrios toda vez que se lembra da maldita
passagem, impedindo-lhe que chegue perto, novamente, da obra de Willian Peter Blatty?”
Me desculpem pela pergunta comprida, mal feita e um pouco
sem nexo, mas foi a única forma que encontrei para expressar aos leitores o meu
pavor com relação ao trecho em que a Regan começa... é... bem...putz!! Lá vai
eu rebuscar essa ‘terrível’ lembrança nas profundezas mais recônditas da minha
memória!! Olha só o que esse post sobre “A Queda”, do Del Toro e do Hogan me
fez!! Mas já que comecei, não vou voltar atrás para ficar rotulado de
‘covardon’, mas não posso negar que já
tinha enterrado aquela visão horrível da Reagan possuída, toda encurvada para
atrás, encostando as duas mãos no chão e descendo a escadaria de seu quarto
igualzinha a uma aranha gigante. Logo em seguida, esse ser demoníaco parava atrás
de um cara que conversava com a sua mãe e ficava olhando para o sujeito com
aquela expressão bizarra no rosto.. Arghhhh!! PQP! O trecho do livro de Blatty
é tão medonho e intimidador que rendeu uma cena horripilante no cinema. Tão
horripilante que chegou a ser cortada pelo diretor do filme em sua versão que
passou nos cinemas em 1973.
Tudo bem que para algumas pessoas, a cena em que a garota
vira a cabeça sobre o tronco, num ângulo de 360 graus, dando uma volta
completa, tenha sido a mais impressionante, mas para o blogueiro aqui, a “Regan-Aranha”
foi a pior (no bom ou no mau sentido, sei lá).
Pois é, e quando pensei que estava livre desse meu medo
interior, eis que chegam as crianças vampiras, conhecidas como “tateadoras”, do
livro “A Queda”, o segundo que integra a chamada “Trilogia da Escuridão”. Podem
acreditar, esses personagens bizarros chegam a superar a “Regan-Aranha” em
várias cenas do romance de Guillermo Del Toro e Chuck Hogan. Elas são
horríveis, maléficas, algo que realmente impressiona o leitor. E quando digo
impressiona, estou querendo dizer que impressiona mesmo!
As tateadoras são crianças cegas transformadas em vampiros
pelo mestre e com uma percepção infinitamente sensível dos outros sentidos em
substituição a visão. Elas não caminham normalmente, mas sobre “quatro pés” como
se fossem aranhas humanas. São totalmente desfiguradas, com uma imagem
assustadora, bem mais do que os vampiros adultos. Se movem de maneira estranha,
todas desengonçadas, mas são rápidas e ágeis. Cara! O que deixa o leitor com
aquele mal estar é a maneira como Del Toro e Hogan descrevem a movimentação
desses seres demoníacos. A forma como elas mexem a cabeça vagarosamente de um
lado para o outro, farejando a sua presa, lembra muito a cena do velociraptor
no filme do Spielberg, “O Parque dos Dinossauros”, quando o dino invade cozinha
da casa de controle do parque em busca daquele menino que se esconde dentro de
um armário. As tateadoras da “Trilogia da Escuridão” não estão muito longe
disso.
As crianças vampiras fazem o papel de “cães farejadores e
caçadores” dos vampiros que as soltam para localizarem e atacarem os humanos
fugitivos. Os melhores momentos do livro são os confrontos entre as tateadoras
e os membros da resistência, com ênfase para a luta com a bióloga Nora que
acontece num túnel subterrâneo do metrô, dezenas de metros abaixo do rio Hudson
que corta Nova York, além do ‘pega prá capar’ antológico com um grupo de
caçadores humanos que saem a procura do professor Setrakian para tentar
salvá-lo de um momento crítico. Esta batalha acontece na casa do velho
professor que acaba sendo destruída e lançada para os ares.
Mas “A Queda” não resume apenas as chamadas
“crianças-aranhas” ou “crianças-vampiras”. O livro vai muito além disso. Aliás,
considero o segundo volume da “Trilogia da Escuridão” uma ‘obra de amarra’.
Escrevo isso, porque Del Toro e Hogan usaram o enredo para amarrar alguns fios
- envolvendo personagens importantes – que acabaram ficando soltos em
“Noturno”.
E agora cuidado com alguns pequenos spoilers. Se você ainda
pretende ler “Noturno”, aconselho que pare por aqui. O primeiro fio que os
autores amarram em “A Queda” diz respeito a Kelly, ex-esposa do Dr. Ephrain
Goodweather, que após ser transformada em vampira pelo mestre inicia uma caçada
desesperada por seu filho. Em “A Queda” você fica sabendo o motivo desse desejo
alucinado da mãe de Zack, hoje uma perigosa vampira à serviço do mestre.
Através de Kelly, você passa a entender também o comportamento social dos
demais vampiros e o que faz com que eles voltem sempre à procura dos seus entes
queridos após serem transformados.
O segredo do coração de um vampiro que o professor Abraham
Setrakian traz guardado em um recipiente e que alimenta com o seu próprio
sangue todos os dias, também tem a sua origem revelada. O misterioso “coração
vampiro” é a porta de entrada para os autores explicarem os motivos que levaram
Setrakian a se tornar um obsessivo caçador dessas criaturas malignas.
No capítulo final de “Noturno”, o destino do personagem Gus,
membro de uma gangue mexicana, que acaba sendo capturado pelos caçadores dos
três vampiros antigos, não é totalmente esclarecida. A final de contas o que
aquelas criaturas que se opõem ao plano do Mestre de conquistar o mundo queriam
com Gus? Em “A Queda”, Del Toro mata a curiosidade dos leitores de uma forma
completa com relação a situação de Gus.
E assim vai, um festival de ‘amarrações de fios’ que nem por
isso torna o livro maçante, ao contrário, acho que ele fica mais interessante
ainda, porque matamos a curiosidade com relação ao destino de muitos personagens
importantes.
Sei que nesse momento, alguns internautas já devem estar
bradando: - “Pô! Mas e a ação onde é que fica?!” Pessoal, podem ficar
tranqüilos que “A Queda”, apesar de em menor quantidade do que Noturno, não
nega fogo no quesito ação. Como já disse o embate entre Nora e as tateadoras comandadas por Kelly nos túneis do metrô é de
tirar o fôlego. A fuga de Zack que tenta desesperadamente fugir das
‘crianças-aranhas’; o roubo do do Occido Lumen pela resistência, um livro
secreto e amaldiçoado que guarda o segredo de como destruir o mestre e
consequentemente livrar a terra do vírus vampírico; a caçada empreendida por
Vasily nos túneis de Nova York, onde pretende instalar uma bomba para matar
milhares de vampiros. Aqui, vale uma ressalva, porque esse momento é ao mesmo
tempo cômico e trágico e tudo por culpa de um mendigo que vive há anos nos
túneis do metrô. O trecho vale e muito!
“A Queda” termina com aquele gostinho de ‘quero mais’. Posso
dizer que sou feliz por poder, logo ao término de A Queda, engatar a leitura de
“Noite Eterna”. A ansiedade em saber como termina a saga de Eph, Nora, Zack,
Vasily e cia é ... digamos que sufocante. Isso mesmo, sufocante!
E olha que não tenho o hábito de ler uma trilogia
sequencialmente. “Noturno” e “A Queda” conseguiram mudar essa mania do ‘menino’
aqui.
Inté!
Postar um comentário