Quando “Desejo de Matar” com o saudoso Charles
Bronson foi lançado nos cinemas em 1974, muitas pessoas sequer imaginavam que a
história havia sido baseada num romance policial publicado dois anos antes do
filme. Livro e filme são verdadeiros contrastes: o primeiro, um fiasco; o
segundo, um sucesso inquestionável.
A produção cinematográfica que elevou, na época, o
nome de Bronson a categoria de atores mais bem pagos de Hollywood fez tanto
sucesso que ganhou mais quatro sequências. A franquia de filmes só terminou em 1994
com “Desejo de Matar V: A Face da Morte”, durando exatos 20 anos.
Quanto ao livro... Infelizmente, ninguém se lembra.
Digo infelizmente porque a obra de Garfield é muito boa e por isso, não merecia
ter permanecido no limbo.
O autor conta a história de Paul Benjamin (no filme
o nome do personagem foi alterado para Paul Kersey), um pacato e obeso
arquiteto de Nova York que decide sair passando fogo na bandidagem depois que
sua família é violentamente atacada por um bando de marginais. A mulher de
Benjamin é espancada e morta. Quanto a filha, após sofrer nas mãos dos
criminosos, não suporta tanta brutalidade e acaba ficando em estado catatônico
para sempre, sendo internada num manicômio. Isto é demais para Benjamin que
percebendo a ineficiência da polícia que não consegue descobrir os autores do
crime, resolve fazer justiça com as próprias mãos.
Mas a sua justiça é distinta. Ele não sai em busca
de vingança contra os homens diretamente responsáveis pelo crime; pelo
contrário, Benjamin nunca os encontra. Furioso com o fato de os cidadãos
honestos serem prisioneiros numa sociedade dominada pelos marginais, o outrora
pacato arquiteto torna-se um justiceiro que passa fogo em todo e qualquer
bandido que encontre pela frente, punindo o crime em geral.
Este é o resumo do livro e também do filme, já que
ambos são semelhantes. Os produtores optaram por uma adaptação fiel da obra de
Garfield, excetuando o nome do personagem principal que foi trocado. Ah! A sua
forma física também, já que Paul Benjamin é um cara obeso, enquanto o Paul
Kersey de Bronson não tem nada de gordo.
Você que assistiu ao filme pode questionar: “Se
livro e filme são parecidos porque perder tempo lendo a história?” A resposta é
simples: lendo o romancevvocê vai acompanhar, em detalhes, as mudanças
psicológicas do personagem, o que não ocorre no cinema.
Garfield mostra a desconstrução de um perfil psicológico
e a construção de outro totalmente diferente. Não espere encontrar no livro a
mesma ação e tiros do filme. Nas páginas, a ação cede espaço para o drama, as
dúvidas, medo e revolta de Paul Benjamin, conhecido como “O Justiceiro”. O
leitor presencia a transformação de um homem pacato em uma pessoa psicótica que
quer eliminar todo ser humano, o qual julgue ser um criminoso, que cruze o seu
caminho. Basta o sujeito colocar a mão no bolso para retirar um maço de
cigarros ou a carteira que Benjamin já estará pensando que ele vai sacar um
revólver ou uma faca. O lado violento e racista do personagem também é
exacerbado no livro. Vejam só o seu raciocínio no momento em que viaja num
vagão de trem lotado de passageiros: “Surpreendeu-se
olhando para todos os rostos como se procurasse entre a multidão de passageiros
alguns que ainda pudessem ser salvos. Quem quisesse fazer alguma coisa a
respeito do excesso de população, ali era o lugar para começar. Contou as
cabeças e descobriu que dentre os cinqüenta e oito rostos, sete pareciam ser de
pessoas que tinham direito à sobrevivência. O resto era carne de canhão... Era
fácil ver nos corpos e rostos que não mereciam viver, que em nada contribuíam,
a não ser a sua catinguenta existência. Para que poderiam servir? Melhor seria
exterminá-los”
Já no filme, vemos um vigilante menos psicótico, já
que não temos acesso aos seus pensamentos mais intimos. A vantagem do romance é
que o autor deixou um pouco de lado as cenas de caçada aos criminosos – acho que
são quatro ou cinco e descritas de maneira bem sucinta – para investir na
composição do personagem.
Por isso galera, vale muito a pena sim, ler o livro.
Postar um comentário