Cara, acabei de ler a coletânea de contos do livro “Além
da Carne” do César Bravo e estou rolando de rir. Rolando não; estou me borrando
de gargalhar, cacarejar, zurrar e muitas outras coisas. E tudo isso por culpa
do conto “A expressão da desgraça”. Man! Man! Man! Adorei a história! Incrivelmente
fantástica. Não poderia deixar de iniciar o post fazendo esse registro. Que
contaço!
Somente para situar os leitores, “Além da Carne –
Contos Insanos” é mais um livro de histórias curtas de terror do escritor
brasileiro e taubatense, César Bravo. Ao contrário de “Calafrios da Noite”,
este outro livro do Bravo pode ser classificado com gore, ou seja, terrorzão
pesado da moléstia. Daqueles que para encarar é preciso ter muito peito por causa
do enredo pesado e sanguinolento. E aqui vale um esclarecimento para aquelas
pessoas que por falta de conhecimento malham esse tipo de literatura, chegando
a confundir gore com má qualidade. Nada a ver. Na realidade, este termo é
utilizado para definir livros e filmes onde a escatologia é descarregada em
abundância com órgãos expostos, sangue, mutações bizarras e por aí afora. Um gênero
que se bem explorado passa a ser respeitado e até mesmo cultuado. Foi assim que
aconteceu com os filmes Evil Dead que no Brasil foi lançado com o nome de “Uma
Noite Aluciante”; “Hellraiser”, “Enigma do Outro Mundo” e “A Volta dos Mortos
Vivos”. Quanto aos livros, bem... antes de criticar o estilo gore, seria bom
você pesquisar um pouquinho sobre a vida de Howard Phillips Lovecraft ou
simplesmente Lovecraft. O cara que ficou conhecido como o pai do gore
influenciou diretamente grandes mestres da literatura de terror contemporâneo,
entre eles a fera Stephen King.
Achei importante fazer esse esclarecimento porque muitas
pessoas insistem em criticar injustamente esse gênero de literatura, taxando-o
do mais puro mau gosto. Não ser fã do gênero é um direito de qualquer leitor,
mas taxá-lo de porcaria ou lixo, já é uma grande injustiça.
“Além da Carne – Contos Insanos” com as suas seis
histórias é a essência do gore. As histórias não só assustam como também
incomodam. E o que é ficar incomodado nesse caso? Simples. É se lembrar de
determinada cena 10, 20, 30 ou 40 anos depois. Foi assim com aquela tomada de
câmera horripilante do filme “O Anticristo”, quando uma mulher possuída pelo
demônio, toda encarquilhada e presa numa cadeira de rodas, conseguiu destravar
as rodas do seu meio de locomoção e seguir sorrateiramente e traiçoeiramente
atrás de um padre que fazia o exorcismo. Quando ele olha para trás dá de cara
com aquele ser demoníaco. Arghhhh!! Quero me esquecer disso ou melhor... tentar
esquecer, mas não consigo. Os contos de “Além da Carne” incomodam dessa
maneira.
Mas pêra aí mêo! Tem alguma coisa errada nesse angu!
Você que lê esse post, deve estar qauestionando: “Pô! Logo no início do texto,
o cara diz que nunca riu tanto em sua vida após ter lido um conto de “Além da
Carne”, mas agora, ele diz que o livro é tão assustador que chega a
incomodar?!!
Pois é galera, mas é aí que entra o dedo do autor.
Escrever uma obra gore não significa despejar no papel apenas sangue, orgãos expostos,
dor e violência. Se fosse assim, não haveria ser humano normal na face da terra
que conseguiria ler tal livro. Nem mesmo o Freddy Krueger ou o Jason Voorhees nos seus melhores dias de cristão. Em tudo que
fazemos ou executamos, há a necessidade de manter o equilíbrio. Porque “Uma
Noite Alucinante” se tornou uma produção Cult da sétima arte? Simples: Sam Raimi
juntou escatologia – das ‘brabas’ – e humor e depois jogou num liquidificador,
misturando tudo! Resultado: o bolo perfeito. Os próprios contos de Lovecraft,
por mais pesados que sejam, sempre tem uma pontinha de humor negro.
Acredito que Bravo foi esperto o suficiente para
pescar o “tal lance”
e com isso escreveu na medida um livro que assusta,
incomoda, mas também diverte. Uma obra gore com todas as letras maiúsculas.
Captcha? Pois é, por isso, ri muito em alguns trechos da obra, mas também
fiquei incomodado com outras passagens.
E como vocês já devem ter pescado, o conto que mais
me agradou foi “A Expressão da Desgraça”, o penúltimo do livro. A história gira
em torno de um quadro maldito pintado por um cigano no ano de ‘mil e oitocentos
e lá vai fumaça’. A obra é tão demoníaca que por mais de dois séculos ficou com
a sua tela coberta para que ninguém a visse. Reza a lenda que o curioso que
decidisse descobrir a tela para ver o que o tal cigano havia pintado, sofreria conseqüências
terríveis em sua vida; não só ele, como também os seus familiares. Aliás, foi
isso que aconteceu com uma mulher que após ver o quadro ficou com a sua vida
completamente desgraçada.
Ocorre que na mesma cidade onde se encontra o quadro
maldito, há também um grupo de garotos que só vive aprontando. Cara! Como esses
meninos me fizeram lembrar da minha infância! Eles vivem lançando desafios uns para os outros e aqueles que deixarem de
cumpri-los, são obrigados a deixar a
tchurma. Exclusão das brabas. O que não deixa de ser um baita castigo.
Prestem atenção no trecho em que um dos pestinhas
recebe como missão: roubar a calcinha da menina mais gostosa da cidade.
H-i-l-á-r-i-o. Rolei de rir! Para cumprir o desafio é montado uma verdadeira ‘operação
de guerra’ para que o pobre coitado possa invadir a casa da garota sem que a
sua mãe e o ‘Zarabatana’ percebam. ‘Zarabatana’ é o nome do cão de guarda da
propriedade. O momento em que o garoto entra no banheiro e começa fuçar no cesto de roupas sujas à procura do
souvenir, mas acaba encontrando outra coisa bem diferente, é deliciosamente
engraçada. Outro trecho hilário é o plano para prender o terrível Zarabatana no
canil. My God!! Ri muito.
Acho que o Bravo escreveu esses trechos cômicos no
conto para preparar o coração dos leitores para o que viria depois. Tensão,
medo e tragédia no melhor estilo gore. O momento em que um dos garotos juntamente
com o seu amigo inseparável é desafiado a invadir a casa onde está o quadro é
arrepiante. A sua missão é bater uma foto do quadro, coberto, é claro. Acontece
que a curiosidade fala mais alto. Entonce...
O final do conto lembra muito “A Coisa” de Stephen
King, quando um dos personagens já adulto, decide voltar para a pequena cidade
onde nasceu para evitar que o quadro amaldiçoado faça uma nova vítima. Creio
que esse conto daria uma sequência ‘da hora’.
Quanto aos outros contos, também são muito bons e
assustadores. “A Cor da Tinta” que abre o livro é ‘trucão’. O leitor tem que
ter nervos de aço e estômago de titânio para concluir a leitura. Um casal de
ciganos decide evocar o “coisa ruim” e trazê-lo, em pessoa, para a nossa
dimensão através de um portal. A intenção do cigano é subjugar o próprio pai da
mentira e torná-lo um escravo seu. Para isso, decide trapacear ou pelo menos
tentar. Conto pesadão ao extremo com trechos escatológicos em abundância. O
final é surpreendente.
Na sequência, Bravo brinda os seus leitores com outro
enredo que tem por base maldições ciganas. E como já disse na Fan Page do
Livros e Opinião, histórias que envolvem maldições ciganas não é para serem
lidas por leitores fracos. O sujeito que decidir encarar a história tem que ser
‘hombre’ até a última gota. Por falar nisso, será que você que não tremeu nem
um pouquinho ao ler “A Maldição do Cigano” de Stephen King ou então ao assistir
“Arraste-me para o inferno”, de Sam, Raimi? “Pagamento Cigano” é o conto mais
comprido de “Além da Carne”, ocupando boa parte do livro. Nele, um técnico de
informática pobretão que só tem clientes miseráveis, além de uma esposa mais ‘feia
do que a morte’ e um menino de 10 anos com limitações mentais, vê a sua vida
mudar após atender uma velha cigana que está com problemas em seu velho
computador. O cara, então, decide dar o golpe e superfaturar o seu serviço,
cobrando um valor bem acima do normal. Como a cigana não tem dinheiro
suficiente, ela decide pagar de uma outra forma, propondo algo irrecusável para
o ganancioso técnico de informática. Algo que no início muda a sua vida para
melhor, levando-o ao paraíso, mas depois...
Em “O Melhor do Contrato”, Lucrécia, uma garçonete sem
sorte, presencia em seu emprego noturno a conversa de três homens misteriosos de
terno caro e sorriso fácil. Mas a empresa que representam não vende ou negocia
nada que ela já tenha visto. Quando um dos homens descobre que Lucrécia está
agachada atrás do balcão ouvindo a conversa, decide lhe oferecer um contrato do
tipo: ou aceita ou...
Arma carregada, bullying e chacina. A impressão que
tenho é que Bravo bebeu – mesmo que à distância – na fonte de “Fúria” (Rage) de
King, mesmo que este não aborde o tema bullying. No conto “A Fera”, Sérginho é
hostilizado ao extremo - na escola onde estuda - por um grupo de garotos
metidos a valentões. Um deles o obriga a fazer coisas impensáveis e que
humilharia um animal. O sofrimento prossegue até que Serginho decide pegar a
sua “fera” e dar o troco, despachando balas para todos os lados. Final
surpresa.
Bem, com relação “A Expressão da Desgraça”, já dei a
minha opinião. Sobrou “Justa Causa”, o conto mais curto do livro, que tem uma
relação direta com “O Melhor do Contrato” e “A Fera”, mostrando o monólogo de
um dos três trabalhadores misteriosos de terno e gravata que grampearam a
Lucrécia.
Só quero dar um toque para o autor que fique atento com
relação a falta de algumas vírgulas, acentos e palavras comidas. Nada que
comprometa o texto. Sei o quanto é difícil esquentar os neurônios para escrever
uma matéria ou um post e depois, ainda por cima, revisá-lo. Sempre acaba
escapando algum errinho ou errão (rs). Isto já não acontece nas grandes
editoras que tem um batalhão de revisores para ficar concertando os erros dos
grandes autores e que cá entre nós, devem ser muitos.
E por falar em grandes editoras, torço para que o
Bravo publique o seu primeiro livro numa delas (até agora ele só lançou versões
digitais de suas obras), pois talento para isso ele tem. Falta apenas ser descoberto.
Fui!
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