O Concorrente

16 junho 2011
Se eu fosse um sargento e o tal Steve E. Souza, um recruta, faria o desgraçado fazer mil reflexões com apenas uma mão sob sol escaldante. Ta bem, ta bem, me desculpe o desabafo, mas acho que o sujeito merece esse castigo, afinal de contas ele destruiu a melhor das cinco histórias escritas por de Richard Bachman – leia-se Stephen King - quando fez a adaptação para o cinema.
Pois é, coube ao notório desconhecido Steve E. Souza adaptar o roteiro do livro “O Concorrente” para as telas. E deu no que deu, um verdadeiro desastre chamado “O Sobrevivente”, tendo no papel principal o brucutu Arnaold Schwarzenegger, antes de ter decidido se aventurar na carreira política.
E o que dói no meu coração é saber que a história de Bachman tinha tudo para se transformar num filme de ficção cientifica primoroso.
“O Concorrente” é fantástico e não é a toa que o próprio Stephen King o considera o melhor dos cinco livros escritos pelo seu alter ego Richard Bachman.
Utilizando-se de uma narrativa extremamente vigorosa e realista, Bachman, transporta o leitor para um mundo futurista, em 2025, dominado pelos meios de comunicação onde a televisão é a grande vedete. Ela invade os lares americanos saciando o desejo de sangue dos telespectadores através de uma rede de TV especialista em promover jogos onde o vencedor ganha como prêmio a vida e o perdedor, a morte. A impressão que temos, ao ler o livro, é que estamos retrocedendo à Roma dos gladiadores, mas à uma Roma do futuro.
A Co-Op City, empresa que domina os canais de televisão em 2025 leva ao ar vários reality shows, cada um mais bizarro do que o outro, entre os quais, um que se chama “Esteira para a Grana”, onde os concorrentes devem correr sob uma esteira – semelhante aquelas encontradas em  academias – enquanto respondem à perguntas de um apresentador. Detalhe obrigatório: os participantes devem ter obrigatoriamente graves problemas cardíacos ou respiratórios. É declarado vencedor aquele que não morrer durante a prova. Outros jogos extravagantes são “Cave a sua sepultura”, “Quanto calor você agüenta”, “Nade nos crocodilos”, “Corra para as suas armas” e o “Foragido”.
Ainda neste mundo bizarro criado por Bachman, os entorpecentes são vendidos em máquinas automáticas e o ar puro é privilégio de poucos já que é comercializado por valores altíssimos.
É neste contexto estranho repleto de bizarrice dominado por uma empresa de  TV mais bizarra ainda, onde a sua arena mortal é o combustível para aumentar a audiência, que o personagem Bem Richards luta para salvar a vida de sua filha.
Richards é um sujeito desempregado e por isso, não tem condições de pagar o tratamento médico que pode salvar a vida de sua filha que tem um grave problema de saúde. Para não ver a sua mulher se prostituindo na esperança de ganhar algum dinheiro para salvar a criança, ele resolve se inscrever no reality show mais perigoso e letal da Co-Op City chamado “O Foragido”.
Após entrar no jogo, Richards passa a ser perseguido por um grupo de policiais corruptos – altamente treinados e equipados – que trabalham para a companhia de TV. Esses policiais conhecidos por “caçadores” são comandados por Evan McCone, descendente direto de J. Edgard Hoover, dos quais, durante os seis anos de programa, nenhum competidor conseguiu escapar com vida.
De acordo com as regras do jogo, cada hora que Richards conseguir permanecer vivo, ele ganha 100 dólares e se não morrer no final de 30 dias, leva 1 bilhão de dólares.
Quando a caçada tem início, Richards se transforma num animal acuado, tendo de usar todas as suas habilidades para fugir dos caçadores que contam com o auxílio da população que também quer a morte do fugitivo, já que a Co-Op City transformou a imagem de Richards num perigoso assassino.
Em resumo, esse é o enredo de “O Concorrente”. Um livro dinâmico e marcante. Uma estréia com chave de ouro de Stephen King na ficção científica, muito o diferente do gênero do qual está acostumado, ou seja, o terror.
Se o livro vale a pena ser lido e relido, o filme do roteirista “maledeto” e do diretor Paul Michael Glaser merece ser esquecido, aliás, merece nem ser visto.
Para início de assunto, transformaram a adaptação de “O Concorrente” para as telas num medíocre filme de ação, mais parecido com um Rambo meia boca, deixando a ficção científica num terceiro ou quarto plano. Todo aquele clima bizarro e doentio explorado por King/Bachmnan no livro foi esquecido.
O Ben Richards criado por King é um personagem complexo, movido pelo ódio que brota de sua alma por não ter dinheiro suficiente para salvar a filha. Esse ódio cresce ainda mais  quando ele é obrigado a se humilhar na frente de milhares de pessoas que passam a caçá-lo como um animal, querendo o seu sangue em troca da vida sua filha. Essa personalidade conflituosa do personagem das páginas de King/Bachman não existe no brutamonte interpretado por Schwarzenegger que só pensa em fugir, lutar e bater.
Quanto aos caçadores, no livro, são homens normais, corruptos, mas normais. Usam armas convencionais e se valem apenas de seu treinamento, perspicácia e inteligência para localizar e conter o foragido. Já no filme de Paul Michael Glaser... Ai Ui-ui! Os caras são verdadeiras aberrações, parecendo ter saído de um manicômio ou então de um circo de horrores. Tem um japonês balofo e mudo caracterizado como jogador de hóquei que ao invés de usar o taco para movimentar o disco, o utiliza como arma para matar os participantes do jogo.  Existe um homem da raça negra, de meia idade, que sai voando graças a um equipamento esquisito amarrado em suas costas e que utiliza um lança-chamas para transformar os foragidos em churrasquinhos. Sem contar, um branquicelo obeso que usa uma roupa energizada, cheia de luzes e neon, dirigindo um carro esquisito. O sujeito consegue disparar uns raios pelas mãos. Pois é, pode acreditar, esses são os caçadores do filme “O Sobrevivente”.
Cruzes! Um verdadeiro festival de esquisitices e sandices. Tenho a impressão que o roteirista estava tendo alguns surtos psicodélicos quando criou esses “caçadores”.
Nem com muita reza dá para encarar o filme. Definitivamente horroroso. Quanto ao livro “O Concorrente”, uma verdadeira obra prima de Bachman. Uma obra para ler, reler e guardar.
Ah! Em tempo! A edição lançada pela Suma traz ainda um capítulo à parte, onde Stephen King explica os motivos que o levou a adotar o pseudônimo de Richard Bachman para escrever alguns livros.
Inté!

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