História real de canibalismo em Porto Alegre inspira livro do escritor e roteirista Tailor Diniz. A obra “Os canibais da Rua do Arvoredo” já está nas livrarias

18 fevereiro 2024

Cara, me lembro do dia em que comi carne de capivara sem saber que era carne de capivara. Isto foi há muitos, mas há muitos anos e coloca mais anos nisso. Muito longe dos meus sessenta e pouquinhos anos atuais, mas ainda me lembro da experiência macabra que tive. Escolhi a palavra “macabra” porque segundo o Dicionário Oxford, o termo significa “horrendo”, “hediondo”, algo que desperta o horror”. E todos esses adjetivos se enquadram perfeitamente na experiência que vivi.

Foi na casa de um amigo meu. Na ocasião, ele me disse que se tratava de carne de porco, mas ao experimentar um pedaço – pedaço que infelizmente e incautamente degluti – percebi um gosto muito adocicado e... parei na mesma hora.

Vem do o meu semblante com um olhar estupidificado. Ele decidiu revelar o teor de sua brincadeira – para mim, de muito mau gosto – juro que fiquei um bom tempo sem comer carne de porco ou de vaca, além de ter sido obrigado a lidar com um verdadeiro motim provocado pelas minhas tripas; um motim que incluiu todos os tipos de revoltas: das náuseas aos vômitos, passando pelo mau estar prolongado.

Ao escrever essa postagem fico imaginando como vários moradores residentes em Porto Alegre se sentiram no período de 1863 a 1864 ao descobrirem que comeram durante todo esse período linguiças preparadas não com carne de capivara, mas com carne humana!! Isto mesmo! Você sabia que na capital do Rio Grande do Sul, um casal assassinou homens, moeu as carnes e os transformou em linguiças comercializadas por toda a cidade? Os moradores, por sua vez, comeram essa iguaria imaginando que estavam deglutindo linguiças preparadas com carne suína ou bovina. Pode parecer uma história macabra, digna de filme de terror, mas foi isso que Catarina Palse e José Ramos fizeram em Porto Alegre, no século XIX.

A prática insólita dos crimes era feita da seguinte forma: os acusados atraiam vítimas para matá-las e, provavelmente, desfaziam de partes dos corpos produzindo linguiças de carne humana pra serem vendidas em um açougue da cidade. Catarina seduzia e atraía os homens para a sua casa, onde o seu marido José Ramos – que ficava escondido no quarto – matava as vítimas. O curioso nisso tudo é que Catarina, pelo que consta, não era uma mulher bonita e muito menos atraente.

Apesar de ser um caso real, ele ainda está presente no imaginário popular local, tendo-se tornando uma espécie de lenda urbana da cidade gaúcha. O fato ficou conhecido no meio policial daquela época como “Os crimes da Rua do Arvoredo”, local onde foram encontrados os restos dos corpos das vítimas e onde as linguiças macabras eram produzidas.

Este enredo hediondo e real valeu um livro chamado Canibais: Paixão e Morte na Rua do Arvoredo de David Coimbra que foi colunista do jornal Zero Hora. No livro publicado em 2005, o autor que faleceu em 2022 aos 60 anos - vítima de um câncer - optou por dar aos fatos jornalístico um tom de romance o que deixou o enredo bem mais fluído.

Escritor, jornalista e roteirista Tailor Diniz

Agora, quase 20 anos após a publicação dessa obra, “Os Crimes da Rua do Arvoredo” voltam as livrarias, mas pelas mãos de um outro escritor, também gaúcho: Tailor Diniz. O escritor, jornalista e roteirista de cinema revive as figuras assombrosas de Catarina Palse e José Ramos na obra Os canibais da Rua do Arvoredo. Neste enredo, o autor satiriza os fatos, também numa linguagem fluida, onde um casal de jovens se muda para antiga residência dos assassinos e quando descobrem um porão, coisas bizarras começam acontecer. Possuídos pelos espíritos dos antigos criminosos, sentem-se designados a cumprirem uma missão de vingança, que, em princípio, não sabem exatamente qual é. Até que cometem o primeiro crime.

Em uma mistura de realidade e ficção, o autor constrói um enredo instigante e assustador que retrata até mesmo os desejos mais estranhos do ser humano.

Os canibais da Rua do Arvoredo é o 22º livro de Diniz e, entre eles, estão Em linha reta, semifinalista do Prêmio Oceanos de Literatura 2015; Crime na Feira do Livro, traduzido na Alemanha e lançado na Feira de Frankfurt, em 2013; Transversais do tempo, Prêmio Açorianos de Literatura – Melhor Livro de Contos de 2007; e A superfície da sombra, traduzido na Bulgária e adaptado para o cinema pelo diretor Paulo Nascimento, em 2017.

Os Canibais da Rua do Arvoredo teve os seus direitos adquiridos pela Accorde Filmes que fará uma adaptação para o streaming roteirizada pelo próprio Diniz e levando a assinatura do diretor Paulo Nascimento ('A Oeste do Fim do Mundo'). O projeto será distribuído pela Paris Filmes.

O livro lançado pela Citadel Grupo Editorial em 30 de dezembro de 2023 está à venda nas livrarias físicas e virtuais do País.

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