007 Contra o Satânico Dr. No

14 setembro 2012


Ian Fleming fez o caminho inverso de Arthur Conan Doyle quando decidiu matar James Bond em Moscou contra 007. Enquanto Doyle eliminou Sherlock Holmes por causa da fama de seu personagem; Fleming assassinou Bond por causa do fracasso do espião.
O sucesso de Holmes foi tanto que acabou se tornando um verdadeiro incômodo para o seu autor que temendo ficar conhecido pela criação de apenas um personagem decidiu mandar o detetive do cachimbo para os “quiabos”. Com essa atitude, Doyle acreditou que poderia desenvolver outros assuntos de seu interesse e que o apreciavam bem mais do que o “inoportuno” detetive. Foi então que começou a desenvolver temas, segundo ele próprio definia: “bem mais sérios”, como por exemplo, livros sobre espiritismo, religião da qual era adepto. Mas após um verdadeiro levante dos leitores que já haviam se acostumado com as histórias de Holmes e que literalmente ‘obrigaram’ Sir Conan Doyle voltar a escrever as histórias do famoso detetive e seu auxiliar Watson, ele acabou ressuscitando o seu personagem.
Com Fleming não foi bem assim... O autor já tinha escrito “Cassino Royale”, “Viva ou Deixe Morrer”, “O Foguete da Morte” e “Os Diamantes São Eternos”, sem que o personagem criado por ele emplacasse. Então, Fleming decidiu escrever o livro derradeiro sobre o agente secreto, aquele que encerraria, definitivamente, a sua carreira. Acredito que o ‘pai de 007’  tenha pensado algo do tipo: - “Tudo bem... vamos esquecer esse ‘cara’ e pensar em algo melhor”. Depois disso meteu a canetada final e Bummmm!! Implodiu a sua criação. Acontece que ele não contava com o tremendo sucesso de público e crítica de “Moscou contra 007” e muito menos que o badalado presidente norte-americano, John Kennedy elegesse o livro como o seu preferido. O que será que Fleming pensou depois disso, heinn?? Sei lá, acho que foi algo do tipo: - “Caraca!!! PQP!! @$#&%$#!!”
Mêo! O sujeito deve ter xingado a quinta geração da sua família. E também não foi para menos, afinal ele havia acabado de perder a sua mina de ouro! Como seqüenciar outros livros com o personagem principal ‘mortinho da Silva’? Foi aí que Fleming deve ter parado de xingar, de se morder, se bater   e de se auto-flagelar. Tudo porque surgiu uma idéia miraculosa: “r-e-v-i-v-e-r” o agora famoso James Bond. Pronto! |Taí a brecha que eu precisava para falar escrever sobre o livro “Dr. No”.
Capa original do livro de Fleming
Por tudo isso que você acabou de ler até aqui, é que considero “Dr No” um livro tampão. Vejam bem, não estou me referindo à obra de uma forma pejorativa, pelo contrário, mesmo porque o livro é muito bom, aliás, só perde para “Moscou contra 007”, considerado o melhor dos 14 livros da ‘geração Fleming’ sobre o agente secreto. Digo “livro-tampão” porque ele preencheu um espaço impossível no enredo da história, possibilitando o retorno de James Bond e consequentemente o reavivamento de toda a série.
“Dr. No” também é um marco nas histórias do agente a serviço de Sua Majestade, já que o trouxe de volta à vida. E nem por “ressuscitar” o charmoso espião, o livro deixa de ser coerente. Ian Fleming provou toda a sua versatilidade e inteligência ao criar um enredo inteiramente plausível para o retorno de Bond do mundo dos mortos. O leitor, de fato, se convence de que o acidente do qual o espião foi vítima no final de “Moscou contra 007”, quando enfrenta uma situação de perigo, não foi tão grave para retirar a sua vida. Enfim, os argumentos apresentados por Fleming são coerentes e convincentes.
Cena antológica do filme baseado no livro: Ursula Andrews (Honey) saindo do mar
O início do livro explica, com riqueza de detalhes, como foi o período de recuperação de Bond que após ter sido atingido por um golpe – literalmente  baixo - aplicado por Rosa Klebb, a diabólica vilã da Smnersh, acaba fazendo uma verdadeira via crucis por vários hospitais. Ao ver que o seu pupilo recuperou a forma antiga, “M” quer que ele volte imediatamente ao trabalho. O médico psiquiatra da sessão 00 não concorda e acha que por Bond ter enfrentado inúmeras situações de perigo somadas a última missão que quase lhe tirou a vida, o ideal seria que ele tirasse uma férias para se recompor, só voltando ao trabalho depois de um certo tempo.
É evidente que “M” não concorda e diz que quer 007 de volta o quanto antes. Com muito custo, ele acaba sendo convencido pelo médico para que, pelo menos, dê uma missão tranqüila para Bond e que não lhe ofereça riscos. Dessa maneira, “M” envia Bond para a Jamaica com a missão de investigar o desaparecimento de um agente do MI6 enquanto este fazia diligencias sobre um recluso cientista, Dr. Julius No.
Bond vai à fundo em suas investigações e acaba descobrindo um plano maquiavélico do Dr. No que pode levar a destruição de muitas cidades britânicas. Assim o que poderia ter sido considerada uma missão tranqüila, “verdadeiras férias nas Jamaica”, como alega ‘M’ em um trecho da história, acaba se transformando numa das aventuras mais arriscadas de 007.
O vilão Dr. Julius No
O livro tem passagens eletrizantes como a luta do agente secreto contra uma lula gigante que é o bichinho de estimação do vilão Dr. No e com o péssimo hábito de devorar seres humanos. O combate entre a besta do mar e um Bond esgotado psíquica e fisicamente, após escapar de varias armadilhas mortais preparadas pelo Dr. No é de tirar o fôlego do leitor.
Esta cena foi cortada do roteiro do filme “007 Contra o Satânico Dr. No”, em 1962, por causa dos custos elevados. Somado a isso, produtores e roteiristas ficaram um pouco temerosos de que a lula gigante que seria criada não convencesse tantos os cinéfilos e provocasse risos ao invés de medo e suspense. E olha que eles tinham razão, já que no início dos anos 60, os efeitos especiais na sétima arte ainda estavam engatinhando. Portanto, adeus ‘lula-monstro” no filme.
Outro destaque da obra é o confronto psicológico entre Bond e Dr. No. Após ser capturado, 007 é convidado pelo vilão para participar de um jantar. É nessa hora que os dois travam um duelo de palavras para saber quem é o mais macho.
A bond-girl Honey, que no cinema foi vivida pela – na época – estonteante Ursula Andrews, é um outro ponto positivo do livro. Ela foge dos padrões “donzela em perigo que grita por socorro”. No romance de Fleming ela também vai a luta e não teme cara feia e ameaças. O autor aproveita algumas páginas para explicar a infância sofrida de Honey que acabou lhe valendo um nariz fraturado. No livro nem mesmo o nariz torto da moça consegue roubar a sua beleza e sensualidade descritas com maestria por Fleming.
Tudo bem que o final de “Dr. No” não fuja dos padrões caricatos das histórias de James Bond, com o herói mesmo capengando, ainda tendo forças para eliminar o seu oponente. Na verdade o que interessa é que o livro é muito bom... bom, de fato!
Ah! Em tempo; esse livro foi, inicialmente, lançado no Brasil com o título de “Terror no Caribe”. Logo depois foi publicado como “Dr. No”. E agora, recentemente, a Editora Record - num projeto frustrado que visava ‘republicar’ em edições de luxo as 12 histórias do agente inglês escritas por Fleming – o relançou como “007 Contra o Satânico Dr No”, aproveitando o título do filme de 62 com o mesmo nome.
Boa leitura!

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